Memória
No Domingo, num jantar de amigos, e quando procurávamos ver o resumo do recém acabado Porto – Boavista, paramos no Canal Memória. Realmente é um nome bem português este, Memória, bem ao jeito do nosso Sebastianismo, do nosso gosto pelo passado que quase hipoteca o nosso futuro. Melhor só mesmo se fosse o Canal Saudade, expoente máximo da nossa triste melancolia pelo passado. Mas avancemos ao que aqui me trouxe. Nesse dito canal passava a reposição do Parabéns, esse programa onde Herman José começava a dar largas ao seu egocentrismo, mas onde ainda talvez jorrassem as suas últimas veias criativas nos seus pequenos espaços de humor. Ficamos a ver por momentos a sua rábula cómica, que definitivamente não espelhava essa criatividade de que falei, e eis quando ouço uma piada alusiva à dupla política mais badalada do momento, às suas crises de amor e de ódio, ás suas birras, ás suas escaramuças bipolares cão/gato. Estou a falar como é lógico dos nossos antigos Primeiro Ministro e Presidente da República, respectivamente Aníbal Cavaco Silva e Mário Soares. E de repente aquilo pareceu tão actual. E de repente essa actualidade pareceu-me tão ridícula, tão triste, tão denunciadora da mediocridade dos nossos políticos, e em última instância da nossa sociedade. Em 15 anos a nossa sociedade não foi capaz de gerar políticos, personalidades, Homens, que sentissem o dever de dar a cara pelo nosso país, que se sentissem capazes de o fazer, ou que apenas sentissem que o deviam fazer. Em 15 anos vemos as mesmas caras nos partidos, mudando de pouso consoante o lado de onde o vento sopra, saltitando de cargo em cargo convenientemente. Em 15 anos, dois senhores que deviam repousar na nossa memória, nesse nosso canal pessoal, bem ou mal conforme o julgamento de cada um, voltam à ribalta pela falta de referências, pela falta de gente capaz na política. Mesmo os mais capazes, políticos ou não, afastam-se de um meio desgastado e onde as regras do jogo estão já viciadas.
Serve o que escrevo aqui, não para zurzir nos candidatos à presidência, nomeadamente nos dois referidos, nem para questionar a sua qualidade e boa vontade, mas antes para realçar a não renovação dos partidos e das instituições. Quando as notícias de hoje se confundem com as de há 15 anos atrás, algo não vai muito bem nesta república solarenga e aparentemente pacata.