Plastic Smile
O que se pode perceber da sociedade dos Estados Unidos é que é extremamente hipócrita. E parece-me que ainda mais na Califórnia. As pessoas são estupidamente simpáticas, daquela maneira que irrita, uns lambe botas, em todas as circunstâncias. É de tal maneira, que somos quase incapazes de perceber realmente quem é quem. As pessoas estabelecem contacto com conversas infrutíferas, parece que se sentem sempre obrigados a dizer qualquer coisa, por mais idiota que seja, desde que seja com um sorriso nos lábios. Faz-me lembrar os personagens de Aldous Huxley no Admirável Mundo Novo, estupidamente felizes graças ao Soma que tomavam, uma espécie de profetização do Prozac. Lembro-me que nas primeiras duas semanas isto me irritava profundamente, e depois fui-me habituando, e agora sou capaz de jogar o mesmo jogo, mas sempre com uma saída subliminar na ponta da língua, na tentativa de o subverter. Dizem que as pessoas em Nova York são antipáticas e egoístas. Eu gostei muito mais das pessoas em Nova York quando lá estive há umas semanas. São menos afáveis no primeiro contacto, mas mais verdadeiras. Não são simpáticas por convenção social, e se são simpáticas é muito menos plástico. Respeito mais alguém que é desagradável comigo, do que alguém que me bajula hipocritamente, na esperança de tréguas bilaterais. Eu não as dou. Sei responder sem ser deselegante, mas sempre com espírito crítico, e é isso que faço. No outro dia num restaurante, num dia um pouco menos brilhante para a minha paciência:
Waitress – Hi! How are you? (voz irritante e penetrante num berrinho de bezerro)
Blue Velvet – Hi! I’m ok. Thanks. (calmo e imperturbável, no que os americanos chamam de “cool”)
W – You are? Nice!
BV – Why? I don’t seem like I’m ok?
W (embaraçada e a medo) – No, it´s not that. I’m sorry…
BV – No problem. I was just testing you.
W (mais descansada, disposta a entrar na brincadeira) – But you really are ok? Or are you just saying that because it’s the usual thing to say.
BV – A little bit of both. You will never know… (riso sarcástico e olhar enigmático)
Waitress – Hi! How are you? (voz irritante e penetrante num berrinho de bezerro)
Blue Velvet – Hi! I’m ok. Thanks. (calmo e imperturbável, no que os americanos chamam de “cool”)
W – You are? Nice!
BV – Why? I don’t seem like I’m ok?
W (embaraçada e a medo) – No, it´s not that. I’m sorry…
BV – No problem. I was just testing you.
W (mais descansada, disposta a entrar na brincadeira) – But you really are ok? Or are you just saying that because it’s the usual thing to say.
BV – A little bit of both. You will never know… (riso sarcástico e olhar enigmático)
E vou-me entretendo, nestes jogos de palavras, para poder manter a minha própria sanidade mental. Pelo menos uma resposta torta por dia vai mantendo o meu espírito livre. E ainda me rio, porque os americanos não estão muito habituados a que lhes respondam assim directamente, e então ficam embaraçados, e tentam continuar a ser simpáticos, a amansar a fera, o que ainda irrita mais. Não consigo ficar indiferente a saídas do género:
Rapariga – Hi! So, you are portuguese?
Blue Velvet – Yes, that’s right.
R – And … do you speak portuguese?
BV – What?
Moises (amigo mexicano de BV, vendo a minha cara de estupefacção) – What are you talking about? Of course he speaks portuguese!
Moises, nome de profeta, parece que adivinhou o que vinha depois do “what” e evitou o pior. Foi grantida a estabilidade relacional no perímetro. E cá vou vivendo eu nesta paz podre com o exterior, mas em paz interior que é o que me interessa.